Para melhor compreensão deste artigo sugere-se a leitura da Parte 1 e Parte 2 que poderão encontrar aqui no site.
Pelos artigos anteriores definimos que a melhor forma para entendermos o treino e jogo de Futebol é encará-lo como um Sistema dinâmico e adaptativo, constituído por elementos que se relacionam e interagem entre si e com o meio envolvente. Passemos então à análise do jogo de futebol que iremos dividir não em fases (defesa e ataque) mas sim em momentos.
O jogo de futebol constituído por momentos de jogo
O jogo permite a identificação de 4 momentos quando a bola se encontra em movimento(Tobar, 2018):
-Organização Ofensiva: caracterizado pelas interações que a equipa assume quando tem efetivamente a posse de bola, fazendo a gestão da mesma de modo a preparar situações para marcar golo;
-Transição Ataque-Defesa: caracterizado pelas interações assumidas durante os instantes em que a perda da posse de bola acontece. Também inclui os instantes que antecederam à perda da posse de bola, isto é, a preparação posicional e mental da equipa para uma eventual perda;
-Organização Defensiva: caracterizado pelas interações assumidas pela equipa quando efetivamente não tem a posse de bola, com o objetivo de se organizar de forma a recuperá-la impedindo que o adversário marque golo.
-Transição Defesa-Ataque: caracterizado pelas interações assumidas durante os instantes em que a recuperação de bola acontece. Também inclui os instantes que antecederam a recuperação da posse de bola, isto é, a preparação posicional e mental da equipa para uma eventual recuperação, antecipando-a;
Todos estes momentos estão ligados e fazem parte de um “todo”, não podendo ser perspetivados de maneira estanque. Embora seja possível a sua padronização, os momentos do jogo são interdependentes e relacionados entre si, não devendo o ataque ser separado da defesa, nem das transições (Tobar,2018). As transições embora sejam instantes muito rápidos, são fundamentais para o equilíbrio do “jogar” de uma equipa e não devem ser vistas como algo anárquico.
Rinus Michaels “batizou” a terminologia momentos de jogo. Ele não perspetivava o jogo em função da sua equipa ter ou não bola, mas sim da mesma estar organizada ou não. Percebeu que a sua equipa revelava-se mais desorganizada na passagem do momento ofensivo para defensivo e vice-versa. Chamou esses momentos de transição.
Embora se reconheça que os momentos do jogo possam ser padronizados e diferenciados uns dos outros, deve-se entender o Jogo como um contínuo e não como algo faseado e compartimentado (Tobar,2018).
“Não consigo dizer se o mais importante é defender bem ou atacar bem, porque não consigo dissociar esses dois momentos. Acho que a equipa é um todo e o seu funcionamento é feito de um todo também” (Mourinho, 2007).
“Às vezes quem não entende o que dizemos, fica com a ideia de que o Benfica é uma equipa de transições. Não! Nós queremos ter a bola, queremos construir a partir de trás, e uma equipa só consegue ser mais equipa tendo mais posse. E o momento em que perdemos a bola? Não há nenhuma equipa do mundo que quer ter bola e que tenha uma transição defensiva fraca. Então temos de trabalhar esse momento. Quanto mais bola recuperarmos, mais temos bola. Não vamos dividir as coisas, porque as coisas estão interligadas…. O jogo não se parte! (Bruno Lage,2019).
Imaginemos uma equipa que consegue roubar a bola imediatamente depois de a perder. Uma visão cartesiana do Jogo (ver Parte 1) e reducionista apenas analisaria esse momento, quase como uma fotografia e elogiaria os esforços, normalmente físicos, dessa recuperação. Não olharia para o “todo” e para o continuum do jogo. Provavelmente essa equipa conseguiu que os jogadores fossem juntos para o campo adversário, dominando-os, gerindo a posse de bola com eficiência e eficácia, colocando jogadores “por fora” e “por dentro” e garantindo a equilibrada ocupação do terreno de jogo. No momento em que perdem a posse, conseguem ter muitos jogadores próximos à zona da perda facilitando uma rápida pressão, o que em caso de sucesso significa uma recuperação quase imediata.
O mesmo será verdade quando não temos a posse de bola e devemos estar constantemente a antecipar o momento em que a recuperamos e o que se sucederá após isso. Devemos pensar e preparar o jogo de uma forma ofensiva mesmo estando sem bola. Com isto é evidenciado que a forma como se defende deve ser perspetivada em função do modo como se deseja atacar (Tobar,2018). O Treinador ao modelar a sua ideia e o seu jogar deverá ter em conta esta articulação dos momentos e não quebrar o jogo de Futebol.
Para finalizar, é importante ressalvar que embora se tenha de perspetivar o jogo como um “todo” inquebrável, ao nível do treino é imprescindível reduzir esse todo pois senão não faria muito sentido treinar e apenas se jogaria. Há a necessidade de no treino seguir a lógica de redução, mas sem empobrecer o Jogo. Nas sessões de treino o objetivo é incidir nas diferentes partes (macro, meso, micro princípios dos 4 momentos) sem que com isso percamos de vista o todo.
“Não há como dissociar, uma vez que tudo está interligado e tudo é interdependente” (Tobar, 2018).
Tobar, J. (2018) Periodização Tática. Entender e Aprofundar a metodologia que revolucionou o treino do Futebol.1ºEdição PrimeBooks.
Muito bom.
Obrigado pelo resumo